Hélio Schwartsman/Folha de São Paulo
Sempre que vem à tona um caso glamoroso de corrupção envolvendo bicheiros e políticos, surgem aqueles que advogam pela legalização do jogo no Brasil. Incluo-me nessa categoria, não por solidarizar-me com bicheiros ou políticos, mas por crer em liberdades.
Existem dois tipos de crimes. Há aqueles -a esmagadora maioria- em que a parte ofendida não concorda com a ação dos bandidos e há outros, como o jogo e o tráfico de drogas, em que as supostas vítimas chegam a fazer fila para ser atendidas pelos delinquentes. É mais fácil reprimir as infrações do primeiro grupo, nas quais a polícia conta com a colaboração da parte lesada, do que as do segundo, que nem sequer são notificadas como crime a esclarecer.O fato de “vítima” e delinquente estarem do mesmo lado significa lucros fáceis, os quais tendem a organizar-se em torno de estruturas criminosas hierarquizadas, que não hesitarão em utilizar parte dos recursos para corromper autoridades.
É claro que a dificuldade de reprimir não é, por si só, um argumento para que desistamos de fazê-lo. A investigação de homicídios também é complicada, mas nem por isso devemos legalizar assassinatos. Ocorre que os crimes relacionados a jogo e drogas, além da anuência da dita vítima, apresentam outra especificidade: o mal resultante da ação fica circunscrito à própria pessoa (torrar todo o patrimônio num cassino) ou está dentro dos limites discricionários facultados a cada indivíduo (ficar doente por não cuidar da saúde).
E não faz muito sentido colocar a polícia para proteger “manu militari” o cidadão de si mesmo. Democracias conferem às pessoas também o direito de tomar decisões erradas.
Legalizar jogo e drogas não implica abandonar ludopatas e dependentes à própria sorte. O Estado pode apoiá-los com programas de prevenção e tratamento. Não são uma maravilha em termos de eficácia, mas a repressão tampouco o é.
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