Mary Zaidan
Voltar atrás, corrigir, pedir desculpas são atos louváveis. Merecem elogios, devem ser incentivados. Mas até os principiantes aprendem rapidamente que é estupidez insistir no erro. Lição básica que Jair Bolsonaro parece não querer assimilar. E, com erros em cima de erros, o presidente se arrisca a minar a confiança nele depositada.
A gravidade maior não está no bate-cabeças entre integrantes de sua equipe, tido como usual em início de mandatos, ou nas idas e vindas em atos oficiais, revogados antes de criarem traumas. Mas nos modos permissivos do presidente diante do comportamento de sua prole e de alguns amigos que começam a dar as caras no governo.
Ter um filho que o escolta na cerimônia de posse como se todo o aparato militar montado não fosse capaz de fazê-lo pode ser apenas um acinte, mas outro que escolhe faltar a uma audiência no Ministério Público ultrapassa todos os limites.
Deputado estadual, eleito senador pelo Rio de Janeiro, Flávio Bolsonaro preferiu dar uma entrevista ao SBT para dizer o que deveria ter dito ao MP. Atitude no mínimo estranha para quem nega qualquer envolvimento no imbróglio de seu ex-assessor, Fabrício de Queiroz.
Bolsonaro não é Flávio e não pode responder pelo rebento. Mas Flávio só chegou onde está usando o nome e a popularidade do pai. O mesmo aconteceu com os demais – Carlos, vereador, e Eduardo, deputado federal. Mais: a primeira-dama Michelle aparece nos rolos de Queiroz, a quem o presidente chama de amigo, parceiro de pescarias.
Queiroz entrou no radar da operação Furna da Onça, que prendeu 10 deputados fluminenses e investiga 24 assessores parlamentares, a partir de movimentações bancárias atípicas detectadas pelo Coaf. Entre 2016 e 2017 os registros mostram entradas de R$ 1,2 milhão, algumas feitas no mesmo dia de pagamento dos demais funcionários de Flávio. Na conta de Michelle foram parar R$ 24 mil que, conforme o próprio presidente explicou, seriam relativos a pagamentos parcelados, não declarados ao fisco, de empréstimo que fizera ao ex-assessor do filho.
Por seu lado, Queiroz garantiu que nunca agiu como laranja dos Bolsonaros e que o dinheiro incompatível com sua renda viria de transações de compra e venda de automóveis. Se é assim tão simples, desnecessário seria alegar motivos de saúde para não comparecer às duas audiências marcadas pelo MP do Rio.
A história ganhou contornos mais pitorescos com um vídeo feito por uma de suas filhas que caiu nas redes no sábado. Nele, Queiroz dança alegre e radiante, tendo um suporte de soro como par.
O conteúdo viralizou. E trouxe os Bolsonaros, incluindo o presidente, para o salão de baile.
Perto dos bilhões afanados na era petista, o caso Queiroz parece pouco. Mas não é. Bolsonaro amealhou milhões de votos como paladino no combate à corrupção. Sérgio Moro, herói da Lava-Jato, operação à qual a Furna da Onça está apensa, é estrela de primeira grandeza na sua equipe.
Ainda que não esteja diretamente na alçada do Ministério da Justiça, a mudez do ex-juiz sobre a confusão armada pela turma do chefe pode ofuscar seu brilho. E encher de pulgas as orelhas de quem apostou no mito.
Mary Zaidan é jornalista. E-mail: [email protected] Twitter: @maryzaidan
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https://veja.abril.com.br/blog/noblat/baila-comigo/
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