A aflição sobre o futuro e o medo quanto ao presente são reais, sem dúvida. A pandemia criada pelo novo Coronavírus (“Covid-19”) atemorizou a sociedade e trouxe muitos questionamentos sobre o funcionamento das empresas, manutenção dos empregos e superação do cenário de crise econômica.
Mas mais uma vez, assumindo o ônus de quem critica construtivamente, preciso contrapor as medidas do Governo ainda que fundamentadas num ideal de auxiliar a economia. Novamente: não vale tudo.
Como diz a Constituição, em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional (art. 62). Só no primeiro ano do governo do presidente Jair Bolsonaro foram editadas 48 MPs, antes de qualquer pandemia.
Mas a Medida Provisória recebe esse nome apenas enquanto não apreciada no Congresso. Se o Congresso aprova, será uma lei tal qual qualquer outra. Deixa de ser “provisória”.
A exemplo da MP 905, que institui o chamado contrato Verde Amarelo, votada esta semana. Editada em 2019, a medida nem deveria se inserir na urgência criada pela calamidade pública que vivemos. Praticamente uma nova Reforma Trabalhista discutida e votada às presas e com baixíssimo debate com a sociedade.
Nela, discute-se a redução do auxílio acidente para 50% do benefício da aposentadoria por invalidez, revogação de uma imensa lista de artigos e parágrafos da CLT, exclusão de descanso semanal remunerado preferencialmente aos domingos, alivia as multas aos empregadores que não cumprirem decisão judicial de reintegração do empregado, redução de FGTS entre outras medidas.
O discurso é o mesmo: amenizar os efeitos da crise e preservar o emprego. Mas lembremos que, mesmo antes da pandemia, como resultado da reforma Trabalhista, o Brasil já contabilizava o negativo recorde de informais e desalentados.
Adiante, teremos de discutir as MPs editadas já durante o estado de calamidade – essas sim, com urgência que justifique sua existência. Porém, no seu conteúdo, a toada é sempre a mesma: trabalhadores com os maiores sacrifícios, grandes empresas e instituições financeiras com grandes auxílios.
Prova dessa discrepância é o valor irrisório de R$ 200 proposto pelo Governo como auxílio emergencial a autônomos, informais e MEIs. Valor que foi aumentado para entre R$ 600 a R$ 1.200,00 por nós na Câmara dos Deputados.
Conforme já manifestou a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, a expectativa, num cenário de crise, é de que a prioridade das medidas governamentais se dirija aos mais vulneráveis, notadamente, aqueles que dependam da própria remuneração para viver e sustentar as suas famílias.
É hora do governo assumir suas responsabilidades e não criar um conflito, uma escolha sobre os ombros dos empresários: ou morre pelo vírus ou quebra, ou dos trabalhadores: ou morre de fome ou será atingido pelo vírus. É preciso que a alta carga de impostos e a burocracia, que pesa sob os empresários, seja discutida na Reforma Tributária. Só assim vamos resolver o problema sem criar esse conflito entre empresário e trabalhador, que são amplamente punidos por essa injustiça.
Não adianta o governo se preocupar apenas com os números do crescimento econômico. É preciso ter desenvolvimento econômico e social, pois o resultado precisa chegar até a vida real, precisam chegar na casa das pessoas.
Em meio a funerais, leitos lotados, estamos prestes a aceitar uma nova “normalidade” também legislativa, de intensos retrocessos, contra os quais luto, pois a depender do Governo já foi escolhido quem vai ter que se sacrificar pelo “Deus PIB”: o trabalhador.
Aliel Machado é deputado federal pelo PSB-PR.
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