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Área da saúde, prioridade entre os brasileiros, enfrenta sérios problemas no país

As cenas de caos na saúde do Rio chamaram a atenção em 2019, mas as dificuldades numa área que sempre aparece entre as prioridades do brasileiro ocorreram, em menor ou maior intensidade, em outras regiões do país. Capitais como Manaus e Natal estão entre as que apresentam quadro caótico no setor. Além disso, no ano passado, 11 redes estaduais tiveram redução de sua estrutura na área, com diminuição no número de estabelecimentos de saúde estaduais entre janeiro e novembro, segundo levantamento do GLOBO com base em dados do Ministério da Saúde. As informações são de André de Souza, Marlen Couto e Sérgio Roxo, o Globo.

Uma das principais dificuldades apontadas por gestores para fazer frente aos problemas é a falta de recursos. O desafio de financiar uma rede ampla de saúde é agravado num momento em que vários estados passam por crise fiscal — a própria legislação limita investimentos quando a arrecadação é menor. Outra causa é a alta rotatividade dos secretários de saúde nos cargos de gestão, o que impede a adoção de políticas de longo prazo. A cada mês, em média 250 cidades (4,5% dos municípios brasileiros) trocam o responsável pela área de saúde.

Entre os estados com redução de estabelecimentos de saúde em 2019, o saldo é de 17 hospitais e 30 unidades básicas de saúde a menos em relação a janeiro. Além desses equipamentos maiores, houve redução na oferta de unidades móveis, consultórios especializados e laboratórios, entre outros serviços.

— Vivemos crise sobre crise e isso ocorre em um momento no qual a população aumenta e os problemas de saúde se tornam mais complexos. Fatores como o não pagamento de pessoal e fornecedores, bem como o desmonte das secretarias de saúde, agravam a situação — resume a médica e professora da UFRJ Ligia Bahia.

Greves, salários atrasados e cirurgias adiadas são alguns dos problemas observados pelo país. Wilames Freire Bezerra, presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e secretário de Pacatuba, na região Metropolitana de Fortaleza, e Alberto Beltrame, presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e secretário do Pará, destacam que municípios e estados têm necessidade de contratar mais profissionais, mas precisam ficar atentos às regras da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que impõem limites para o gasto com o pessoal. Segundo Bezerra, do Conasems, atrasos nos salários são observados mais comumente em locais onde a crise financeira é problema antigo:

— Pela nossa observação é nos estados em que tradicionalmente isso vem ocorrendo há algum tempo.

Os dois avaliam que os problemas são agravados ainda pela judicialização — decisões da Justiça determinando a administração pública a custear tratamentos que, frequentemente, são caros e sem eficácia comprovada.

— A estimativa é que a judicialização consome R$ 14 bilhões da saúde. Os gestores ficam com uma situação difícil, porque o planejamento se compromete — diz Beltrame.

Segundo o DataSUS, o estado perdeu um hospital e 61 ambulâncias em 2019.

O governo estadual diz que os veículos, recebidos em 2005, estavam obsoletos, e que adquiriu 72 unidades do Samu.

Trocas de secretários
A troca de comando nas secretarias de saúde é outro fator citado pelos especialistas. Em Roraima, por exemplo, desde que o atual governador, Antonio Denarium, assumiu em janeiro de 2019, quatro pessoas já passaram pelo posto. Cecília Smith Lorezom, a terceira delas a assumir o cargo, foi exonerada em dezembro em meio a uma greve de enfermeiros.

— As gestões estaduais modificam muito as suas composições. E os municípios não ficam atrás. A cada mês, nós temos uma rotatividade média de 250 gestores municipais. Isso é um grande desafio para poder dar continuidade ao planejamento que tem sido feito ao longo do tempo — diz Bezerra, do Conasems.

Em Manaus, os pacientes encontram longas filas, dificuldades para marcar consultas e cirurgias, falta de equipamentos nas unidades e atraso no pagamento de profissionais. O grosso do atendimento na capital do Amazonas é feito pela rede estadual. Ao município, cabe a gestão das unidades básicas de saúdes (UBSs). Há apenas um maternidade da prefeitura, e o estado arca com a média e alta complexidade.

O Sindicato dos Médicos do Amazonas enviou na semana passada um documento para o Ministério Público com pedido de apuração dos problemas na saúde. São relatados no ofício “a falta de medicamentos e insumos nas unidades hospitalares, ausência de equipamentos para exames”. Diz o texto ainda que no início de 2019 o governo tomou medidas “para a redução de até 25% de todos os serviços, os quais já se encontravam deficitários”.

— São normais aqui atrasos na remuneração de cinco ou seis meses — afirma o presidente do sindicato, Mário Rubens Macedo Vianna.

Segundo a entidade, a espera por cirurgias, de hérnias ou vesícula, por exemplo, chega a seis meses. Também são constatadas superlotações nas unidades básicas e nas de maior complexidade. Em novembro último, os médicos do Amazonas chegaram a fazer uma paralisação de três dias contra a decisão do governo de suspender reajustes até 2021.

A Secretaria de Saúde informou que vem trabalhando para melhorar e ampliar a cobertura básica e que ampliou o horário de atendimento em dez locais. Informou ainda ter diminuído as filas e o tempo de espero dos pacientes do SUS.

Ambulâncias obsoletas
Na rede estadual do Rio, o Ministério da Saúde aponta o encerramento de atividades em 2019 de um hospital especializado e de 61 ambulâncias. A secretaria estadual informou que o número se refere a veículos Samu doados pelo governo federal em 2005 e que estavam “obsoletas, sem condições de manutenção e fora de operação”. O governo fluminense diz ainda que no ano passado distribuiu 66 ambulâncias para 47 cidades do Rio, além de ter adquirido seis para a própria rede.

Na capital, funcionários da rede municipal de Saúde fizeram paralisação em dezembro. Clínicas da famílias e centros de atendimentos em hospitais não funcionaram entre os dias 11 e 12. Unidades de emergência chegaram a ter o efetivo reduzido pela metade.

Em Natal, a greve de médicos durou 40 dias, entre novembro e dezembro. A paralisação tinha como alvo o não pagamento de uma gratificação a 100 profissionais que haviam sido convocados para começar a trabalhar em 2018. Segundo o sindicato dos médicos, a capital possui apenas 130 das 220 equipes de saúde da família que deveria ter.

— Mais de 40% da população de Natal está desassistida na atenção básica — diz o presidente do sindicato, Geraldo Ferreira.

Os serviços são prestados pela prefeitura e pelo governo estadual, já que a rede é integrada. A secretaria de Saúde de Natal informou que todas as unidades estão em boa situação estrutural e de operação, e que nos últimos dois anos, mais de 40 unidades foram construídas ou reformadas.