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Aplicação excessiva de agrotóxicos provoca alerta

Aplicação excessiva de agrotóxicos provoca alerta

Os números são impressionantes. O Paraná, o maior produtor de grãos do país, joga no ambiente 4 mil toneladas de agrotóxicos por ano, o que equivale a 66 quilos de veneno por minuto. Segundo dados da Secretaria estadual da Agricultura e do Abastecimento, a aplicação de inseticidas aumentou no Paraná 87% em nove anos, passando de 2,14 aplicações em média para quatro aplicações, isto é, quase 10% ao ano nos últimos anos.

Somando-se os agrotóxicos permitidos legalmente aos que entram clandestinamente pelo Paraguai, que já constituem 30% do veneno utilizado no oeste do estado, estima-se que o Paraná destine ao ambiente 5 milhões de quilos de veneno cada ano, segundo cálculos feitos pelo deputado estadual Luiz Eduardo Cheida (PMDB) em 2008. Cheida ainda acrescenta 4 milhões de venenos proibidos estocados em propriedades rurais, em lugar incerto e não sabido, há mais de vinte anos, o que faz os paranaenses entrarem em contato com 9 milhões de quilos de agrotóxicos todos os anos.

CAMPEÃO EM AGROTÓXICOS

O Brasil se tornou, em 2008, o maior consumidor mundial de venenos agrícolas, com 733,9 milhões de toneladas, uma média de 3.700 quilos por pessoa. Ultrapassou os Estados Unidos, que consomem 646 milhões de toneladas. Em 2007, as vendas no Brasil significaram 5,372 bilhões de dólares e, em 2008, 7,125 bilhões. A cultura que mais consome agrotóxico é o soja. No total, os herbicidas representam cerca de 45% das vendas, os inseticidas 29% e os fungicidas 21%. Esses venenos são vendidos por transnacionais como a Basf, a Bayer, a Monsanto, a Du Pont, a Syngenta, a Bungue e a Shell Química.

Esses venenos são de origem química e permanecem na natureza. As lavouras que mais usam agrotóxicos são a cana-de-açúcar, o soja, o arroz, o milho, o fumo, o tomate, a batata, a uva, o morango e as hortaliças. Todos os venenos deixam resíduos no organismo das pessoas, afetando células, e um dia podem se transformar em câncer.

Os pesticidas são usados em grande quantidade há mais de meio século pela agricultura intensiva. Resíduos de pesticidas são encontrados em toda parte: no solo, na água, no ar, na água da chuva, no organismo das pessoas e dos animais. Os pesticidas também estão presentes nos alimentos: eles aparecem em frutas e legumes produzidos pela agricultura intensiva. Acabam nos organismos das pessoas, trazidos pela água e pelos alimentos consumidos. Assim, os organismos das pessoas acolhem centenas de moléculas tóxicas de muitos pesticidas.

CULTURA CRÍTICA

Segundo os últimos dados divulgados pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para), da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o tomate, o morango e o alface foram os alimentos que apresentaram em 2007 os maiores números de amostras com teores de resíduo acima do permitido e o uso de agrotóxicos não autorizados para essas culturas.

Resultados das análises feitas entre maio e dezembro de 2007 pela Secretaria da Saúde do Paraná demonstraram que apenas as bananas e as maçãs não estavam em desacordo com a legislação vigente, e que 57,1% dos morangos apresentaram até cinco substâncias agrotóxicas não autorizada para a cultura ou acima dos limites máximos permitidos. Além disso, 71,4% dos tomates analisados continham substâncias não autorizadas para essa cultura e 60% dos alfaces apresentaram substâncias não autorizadas e em quantidade acima da permitida pela Anvisa.

Em 2007 ditiocarbamatos, substâncias que têm sido associadas ao bloqueio do funcionamento da tireóide, foram detectados no alface. Ainda em 2007 foram encontrados resíduos de endossulfan em batata, o que não é permitido no Brasil para essa cultura. O morango continua sendo uma cultura crítica, devido ao uso de agrotóxicos não autorizados, a presença de resíduos acima dos limites máximos de resíduos estabelecidos e a maior concentração de diferentes princípios ativos na mesma amostra.

PROBLEMA SÉRIO

Apesar do trabalho desenvolvido no país e no Estado do Paraná entre a Anvisa, a Secretaria estadual de Saúde e outros órgãos envolvidos, os princípios ativos não autorizados continuam sendo utilizados na produção agrícola, gerando resíduos nos alimentos.

Esses pesticidas provocam um problema sério de saúde pública, não só para os produtores que ficam expostos à ação nociva desses produtos, aumentando o número de intoxicações, mas também para a população em geral. Os efeitos de pequenas quantidades de pesticidas combinados, durante longos períodos, trazem vários problemas à saúde. A epidemiologia mostra que as pessoas expostas aos pesticidas correm mais risco de desenvolver doenças como câncer, malformações congênitas, problemas de infertilidade, e problemas neurológicos ou um sistema imunológico mais fraco são mais freqüentes.

Diante dessa situação, só há uma solução: avaliar melhor os pesticidas para proibir os que apresentam um potencial tóxico para as pessoas, comprovado ou mesmo suspeito, e sobretudo diminuir consideravelmente o uso dos pesticidas, mudando o tipo de agricultura praticada.

MANEJO INTEGRADO

A Secretaria da Agricultura e do Abastecimento está realizando um amplo programa de Manejo Integrado de Pragas no Paraná, com o objetivo de reduzir em 30% o número de aplicações de inseticidas nas lavouras num prazo de quatro a cinco anos. A preocupação é estancar a aplicação excessiva de agrotóxicos nas lavouras, procedimento que no futuro poderá ser apresentado como barreira sanitária aos produtos produzidos no Paraná.

A meta inicial é conter o uso de inseticidas nas lavouras de soja, milho e trigo, que ocupam o mesmo espaço geográfico no Estado, mas os procedimentos podem ser adotados em outras culturas. De acordo com o engenheiro agrônomo e entomologista da Emater-PR, Lauro Morales, o volume de inseticidas que está sendo usado nas três lavouras daria para fazer 1,6 aplicações em todo o território paranaense, que abrange 20 milhões de hectares.

A intenção da Secretaria da Agricultura é voltar a incentivar o controle biológico e o uso de produtos mais seletivos. Os técnicos da Secretaria propõem a racionalização na hora de aplicar os agrotóxicos e também a revisão das recomendações atuais quanto ao tipo de produtos. A proposta visa recomendar o uso de produtos menos agressivos ao meio ambiente. “O grande problema dos produtos mais agressivos é que eles provocam problemas neurotóxicos nas pragas, mas também nos homens e animais”, diz Morales.

Em toda parte, em quantidades cada vez maiores

Os produtos químicos estão em toda parte. Nos campos com os pesticidas, nas casas, nos jardins, nas roupas. As indústrias químicas produzem diariamente milhares de compostos químicos. Esses compostos são disseminados no ambiente e se encontram inclusive nos organismos das pessoas e dos animais. Na maioria das vezes, há carências na avaliação da toxicidade e periculosidade dessas substâncias.

Existem na Europa e nos Estados Unidos, onde a maior parte dessas substâncias é produzida, diferentes textos de lei que regulamentam as diversas “famílias” de produtos químicos – os biocidas, os pesticidas e todos os outros, que, depois de se terem beneficiado de uma não “regulamentação” durante muitos anos, são hoje objeto de atenção especial da União Europeia (UE). A UE deseja, hoje, regulamentar seu lançamento no mercado e trabalha em colaboração com as ONGs (organismos não governamentais) e as indústrias.

Águas contaminadas

Segundo comunicado do Instituto Francês do Ambiente, em 2006 96% dos rios e 61% dos lençóis freáticos na França continham resíduos de pesticidas. Foram encontrados 229 pesticidas diferentes nas águas de superfície e 166 nos lençóis subterrâneos. O glifosato, princípio ativo do defensivo agrícola RoundUp e seu produto de degradação, o AMPA, são as substâncias que mais poluem as águas de superfície naquele país. O AMPA foi encontrado em mais de 55% das amostras e o glifosato em mais de 35%.

O problema se torna mais sério porque já em 2002 foi detectada uma presença muito forte de pesticidas na água, naquele país. Eles estavam presentes em 75% das águas superficiais e em 57% dos lençóis subterrâneos.

Pesticidas no ar

Um estudo da Airparif, o organismo francês que faz o controle da qualidade do ar em Paris e nas municipalidades ao redor, mostrou em 2007 que pesticidas estão presentes no ar inclusive no centro da capital da França e das cidades vizinhas. Estudos anteriores já haviam detectado a presença de pesticidas nas cidades de Lille e de Orléans. Nesse estudo, dos 80 pesticidas pesquisados, trinta foram encontrados em zona rural e vinte nas aglomerações urbanas. Algumas moléculas usadas em jardins e na agricultura foram detectadas em quantidades importantes em áreas urbanas.

As moléculas detectadas – como a trifluralina, o clorotalonil, a pendimetalina e o lindade, hoje proibido – colocam o problema da redução da exposição das populações a essas substâncias, e portando a redução do seu uso. A trifularina e a pendimetalina podem provocar o câncer, são perturbadores endócrinos e poluem as águas.

Outros estudos comprovaram que 25 a 75% dos pesticidas aplicados na agricultura se encontram na atmosfera, no momento em que são usados ou depois, volatilizando-se.

Pesticidas dentro de casa

Uma pesquisa feita nos Estados Unidos mostrou a presença de pelo menos um pesticida no ar das casas estudadas. Outro estudo comprovou no mesmo país a presença de 8 a 18 pesticidas diferentes por residência. Uma pesquisa realizada na Alemanha demonstrou a presença de permetrina em 90% das casas estudadas. Segundo esse estudo, o ar de dentro das casas parece mais contaminado pelos pesticidas que o ar de fora. Outro estudo alemão concluiu que o uso de pesticidas nas imediações das casas tinha como resultado aumentar sensivelmente sua presença residual dentro das residências.

Os pesquisadores mostraram que os pesticidas entram na casa principalmente com a poeira e as partículas de terra trazidas de fora pelos animais domésticos e pelas próprias pessoas quando entram dentro de casa. Os pesticidas presentes dentro das casas podem ter sido usados dentro das próprias casas. É o caso dos inseticidas: foram detectados em mais de 80% das poeiras coletadas por um estudo feito na Alemanha.

Fonte: Jornal  Meio Ambiente, Curitiba