(*) Carlos Molina
Vendo uma matéria impressa na Gazetona de ontem, o que por si só já gera desconfiança sobre a veracidade do conteúdo, a mesma me fez retornar ao túnel do tempo. E assim quando me vi estava de volta às lutas contra a ditadura e pela democratização do país, e seus principais personagens.
Não dá para esquecer de que Gazeta (RPC) apoiou a ditadura, e sob a proteção desta construiu seu império midiático.
Naqueles importantes momentos vividos no limiar da década de 80, onde as esquerdas, embora muito das agendas fossem comuns, estavam dividas em três frentes, PMDB, PDT e PT, Embora cada uma delas com suas táticas, a estratégia visando à derrubada da ditadura era comum, já que todos estes seguimentos mais avançados pregavam as eleições diretas para presidente, precedidas de um governo democrático, popular e nacional, palavra de ordem que mobilizava amplos setores a esquerda.
Com o avanço da radicalização social, sendo aos poucos as liberdades democráticas duramente conquistadas, pelo aumento da pressão popular de cidadãos ligados ao Movimento Social organizado ocupando as ruas (operários, servidores públicos, estudantes, ambientalistas, etc.), o fim da ditadura se fazia cada vez mais próximo.
Embora a pressão fosse grande a ditadura não recuou de vez, mas conquistamos a importante vitória de podermos em 15 de novembro de 1982 elegermos os governadores, que administrariam seus estados por quatro anos, a contar de 15 de março de 1983. Este pleito envolveu cerca de 60 milhões de eleitores, sendo a primeira eleição direta para governador de estado desde os anos 1960. Neste pleito valeu o “voto vinculado”: o eleitor teria que escolher candidatos de um mesmo partido para todos os cargos em disputa, sob pena de anular seu voto. No cômputo geral os resultados auferidos pelo governo (PDS) foram similares aos dos partidos de oposição.
Nesta eleição a oposição elegeu 10 dos candidatos a governadores, sendo nove pelo PMDB e um pelo PDT. Embora o PDS, partido da ditadura na época presidido pelo Sarney, tenha ganhado na maior dos estados (12), a maioria absoluta dos votos foram dados à oposição.
Com a oposição a ditadura ocupando este novo espaço ficou bem mais fácil à caminhada dos segmentos mais a esquerda, já que nestes estados a repressão diminuiu muito, e assim o Movimento Social pode exercer o direito a liberdade de organização, manifestação e expressão com mais intensidade.
Aqui no Paraná o Mussi (ex-APML), foi nomeado secretário da Segurança, o Claus Germer (marxista e líder sindicalista) nomeado secretário da Agricultura, O Nelton (social democrata de esquerda e dirigente da Tendência Popular) foi o secretário do Desenvolvimento Urbano, o Horácio (marxista) nomeado secretário da Justiça, na Casa Civil o secretário era o Oto (membro da direção do PCB), como em dezenas e dezenas de outros cargos, naquele governo, a esquerda ocupou um grande espaço.
Aqui em Curitiba, atendendo ao apelo da base histórica do PMDB, foi nomeado prefeito o Maurício Fruet, também quadro progressista. Na gestão municipal do Fruet a esquerda também ocupou um grande espaço. Nela até dirigentes do na época ainda diminuto PT ocuparam cargos. No DDS (Diretoria de Desenvolvimento Social) se concentrou grande parte da esquerda. Nesta diretoria, que hoje teria poder equivalente a uma super-Secretaria, estava abrigada a Saúde, Creches, Apoio aos Idosos, Oficinas Comunitárias, Regularização Fundiária, Urbanização de Favelas. Quem comandava o Departamento era o Teixeirinha, também ex-preso político, de cuja equipe me orgulho muito de ter feito parte.
Quero, entre tantas outras dezenas de episódios da luta popular naquele período, destacar um fato histórico. Estávamos acampados na Boca Maldita fazendo uma greve de fome pela libertação do Juvêncio Mazarollo, o último condenado pela Lei de Segurança Nacional em nosso estado. E a PM, ainda Força Auxiliar do Exército e assim subordinada diretamente a este, seguindo ordens do Comando da Região Militar, não acatou a contra ordem do Mussi, secretário da Segurança, e se dirigiu para o local para nos tirar a força de lá. Um coronel, do qual não lembro o nome, todo arrogante se dirigiu a nós manifestantes e nos ameaçando deu o prazo de meia hora para que saíssemos sem o uso de força. Ligamos para o Mussi e este imediatamente para lá se dirigiu. Lá chegando o secretário exigiu que o coronel retirasse da Boca a tropa de choque que nos cercava. Este em voz alta falou que não obedecia ao comando do secretário, que tinha ordens superiores do Exército. O Mussi ficou roxo e disse: “Sim, você está subordinado a mim, tanto que caso não venha respeitar a minha ordem você será reformado a bem do Serviço Público”. O coronel disse: “Você não ousaria”. O Mussi respondeu: “Seu filho de uma puta ouse desacatar a minha ordem para ver o que vai acontecer”. O resultado foi à tropa ter “docilmente” voltado para o quartel.
Querer tirar do governo Richa este importante papel de ter estado ao lado do povo é no mínimo uma sacanagem.
Nas favelas de Curitiba, mesmo com as áreas ocupadas ainda não estando regularizadas, o governo estadual ordenou que as redes de energia e água fossem instaladas, como estimulou a criação de cooperativas para com que através da parceria destas as obras de urbanização nestas fossem realizadas pela própria população carente e desempregada destas comunidades carentes.
Falar que neste período o governo do Estado esteve ausente das lutas populares por mais liberdade e pela melhoria da qualidade de vida de nosso povo é no mínimo falta de informação.
O PMDB do Paraná,e seu governo (Richa), naquele período tinha uma clara postura centro esquerda, e aqui em Curitiba, ainda um pouco mais a esquerda ainda.
Quem em 1983, aliado com outras forças (PT e PDT) começou com a campanha pelas Diretas Já foi o PMDB Nacional, e com total aval dos seus governadores, senadores, deputados, prefeitos e vereadores eleitos por este Partido, e aqui com o José Richa e o Maurício Fruet não ocorreu diferente.
Ainda em 1983 o deputado federal Dante de Oliveira (PMDB/MR8) apresentou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº5/1983. Está tinha por objetivo reinstaurar as eleições diretas para presidente da República no Brasil, através da alteração dos artigos 74 e 148 da Constituição Federal de 1967 (Emenda Constitucional nº 1, de 1969), uma vez que está tradição democrática havia sido interrompida no país pelo golpe militar de 1964.
Da parte do Richa, do Fruet, dos deputados ( Alencar, Requião, Heitor, Waldyr Pugliesi, Acir Mezzadri, etc.) e demais parlamentares nós que comandávamos o Movimento pelas Diretas Já tivemos todo apoio, como antes tivemos na reconstrução da UNE, UPE, DCEs, Sindicatos, Entidades Ambientalistas, Movimentos Culturais, Movimentos Comunitários, etc. também já havíamos tido.
Seria uma grande contradição caso o maior partido de oposição não tivesse ocupando está vanguarda. Dentro do MDB, depois PMDB, estavam abrigados o PCB, o PC do B, o MR8, os Autênticos, a Tendência Popular, etc.. Eram ouros momentos e o PMDB, sem o Sarney et caterva no mando, era outro.
Poderia escrever por 10 horas, já que as ações de massa foram centenas, como pelo bem da verdade estou disposto a debater sobre isto com quem quer que seja, mas acho que já escrevi o suficiente para ser compreendido.
Dizer que naquele momento o Richa foi contra o as Diretas ou qualquer outro Movimento anterior (CBA, CDAMA, ME, MB, MCCV, etc.) é faltar com a verdade perante os fatos.
Embora não fosse de esquerda seu governo foi centro esquerda, e o maior exemplo disto foi o espaço que os setores de esquerda esteve ocupando neste.
Na foto Richa com Dante de Oliveira.
(*) Carlos Molina é militante político
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