Após três meses do atentado contra o presidente eleito Jair Bolsonaro, ainda pairam algumas dúvidas sobre o caso. O garçom Adélio Bispo de Oliveira agiu sozinho? Quem bancou os advogados que viajaram numa aeronave privada para atender o esfaqueador preso em Juiz de Fora, Minas Gerais? Essas questões estão sendo apuradas pela Polícia Federal – que passou a investigar integrantes da defesa do réu confesso. Num depoimento sigiloso, um dos suspeitos contou detalhes de como foi contratado para ajudar o criminoso perante a Justiça.
O criminalista Zanone Manuel de Oliveira Junior, coordenador da defesa de Adélio Bispo, afirmou para a Polícia Federal que, logo após o atentado contra Bolsonaro, foi procurado por um desconhecido para atuar no caso: “Aquela pessoa se apresentou como conhecido de Adélio Bispo da cidade de Montes Claros, esclarecendo que conheceu o autor do fato criminoso em relacionamentos vividos no meio religioso naquela cidade”. O advogado ainda lembra que o contratante disse ter conhecido Adélio numa “evangelização na cidade de Salinas, Minas Gerais”.
Em depoimento, Zanone contou que se reuniu com o desconhecido em seu escritório em Belo Horizonte, MInas Gerais, na manhã seguinte ao atentado, em 7 de setembro. Naquele encontro, o advogado disse que cobrava, em média, 150 000 reais em honorários. Mas o contratante achou o valor alto. O criminalista, então, topou dar um desconto de 83% — e receber 25 000 reais até a conclusão da investigação da Polícia Federal. “Aquela pessoa aceitou a proposta e pagou inicialmente o valor de 5 000 reais em dinheiro”, disse Zanone. O restante seria pago em outras parcelas mensais. No entanto, o interessado em ajudar Adélio “desapareceu”.
Ao se justificar por que aceitou defender Adélio por um valor inferior ao que costuma cobrar de seus clientes, Zanone disse que a “causa seria de interesse de qualquer advogado”. Ele também afirmou que contava com a possibilidade de participar de uma “audiência em plenário do júri em que estariam presentes testemunhas como o ex-presidente Lula, o deputado federal Jean Wyllys, a cantora Preta Gil e a deputada Maria do Rosário”. O advogado arrolou essas pessoas, consideradas por ele desafetos do presidente eleito, para serem interrogadas no tribunal. A estratégia era dar uma grande exposição ao caso, assim como no julgamento do goleiro Bruno Fernandes de Souza, em que Zanone representou o ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola.
À Polícia Federal, o advogado contou um episódio curioso: um de seus parceiros na causa, o criminalista Pedro Possa, chegou a dizer para Adélio que a mãe do esfaqueador estava pagando os honorários da defesa, mas quando soube que “ela era falecida disse apenas que era alguém do seu relacionamento da igreja”. Questionado sobre a identidade do “patrocinador”, o advogado disse que não a revelaria para preservar o sigilo profissional e a integridade física do contratante, “que corre risco de morte”.
Zanone colocou à disposição da PF os seus extratos bancário e telefônico a partir do dia 6 de setembro, data do atentado contra o presidente eleito. Essas e outras informações estão sendo analisadas pelo delegado Rodrigo Morais Fernandes, responsável por conduzir o inquérito. Procurado, ele não quis comentar. Zanone afirmou que topou trabalhar no caso porque sabia que teria uma “grande exposição”. A investigação deverá ser concluída no início do próximo ano.
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