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A sexta-feira em que a “IstoÉ” derrocou de vez

São fortes as impressões de que um era se encerrou para a IstoÉ nesta sexta-feira (02/03). A terceira maior revista semanal do Brasil, fundada pela Editora Três em 1976, deve passar às mãos do investidor baiano Daniel Dantas. Tão logo se fortaleceram os rumores da venda, jornalistas da editora anunciaram greve.

As negociações entre o "banqueiro orelhudo" e o empresário Domingo Alzugaray, proprietário da Três, duraram três meses. Terminaram com o grupo Opportunity, de Dantas propondo a compra de 51% das ações da editora – porcentagem que se refere ao direito de uso da marca. O contrato deve ser assinado na próxima terça-feira e é a primeira investida do banco no setor de mídia. Leia a íntegra desta matéria, de Paulo Nitsche, em Reportagens.

A sexta-feira em que a “IstoÉ” derrocou de vez

A sexta-feira em que a "IstoÉ" derrocou de vez

São fortes as impressões de que um era se encerrou para a IstoÉ nesta sexta-feira (02/03). A terceira maior revista semanal do Brasil, fundada pela Editora Três em 1976, deve passar às mãos do investidor baiano Daniel Dantas. Tão logo se fortaleceram os rumores da venda, jornalistas da editora anunciaram greve.

As negociações entre o "banqueiro orelhudo" e o empresário Domingo Alzugaray, proprietário da Três, duraram três meses. Terminaram com o grupo Opportunity, de Dantas propondo a compra de 51% das ações da editora – porcentagem que se refere ao direito de uso da marca. O contrato deve ser assinado na próxima terça-feira e é a primeira investida do banco no setor de mídia.
 
"Se os rumores correspondem à verdade, registramos a perfeita metáfora, a parabula e a parábola das ilusões perdidas", escreveu, em seu blog, o jornalista Mino Carta, um dos mentores da IstoÉ. Perdida a revista já estava, a ponto de receber apelidos tais quais "QuantoÉ" e "IstoEra". Negociações de reportagem fartavam na mesa e nos telefones de Alzugaray.
 
As tramóias não foram suficientes para alavancar a editora, que também publica as revistas IstoÉ Dinheiro, Dinheiro Rural e IstoÉ Gente. As dívidas da Três superam a marca de R$ 600 milhões e, segundo uma fonte ligada a Daniel Dantas, continuarão sendo de Alzugaray. São, basicamente, dívidas trabalhistas e tributárias.
 
Disputa entre grupos – Em dois comunicados enviados por e-mail nesta sexta-feira, funcionários da editora expuseram as razões da greve e pediram mais transparência da diretoria. Enquanto os jornalistas da Três estão parados desde as 13 horas, operadores de telemarketing e funcionários administrativos só entram em greve às 18 horas de sábado.
 
Além do Opportunity, mais dois grupos cobiçavam a editora: a CBM (de Nelson Tanure) e Grupo Camargo de Comunicação (ligado ao Bandeirantes). Os funcionários temiam mais que Tanure adquirisse a Três, haja vista o inferno em que ele transformou as redações do Jornal do Brasil e da Gazeta Mercantil. Na reta final, a TV Record, do bispo Edir Macedo, também fez propostas de compra.
 
A notícia da venda para Daniel Dantas não tranqüiliza a categoria, que continua sem saber quando vai receber salários atrasados e outros direitos. A expectativa é que o banqueiro arque com esses pagamentos. Funcionários também reclamam que a diretoria da editora não dá dados sobre as negociações, elevando desgaste.
 
As mensagens – O primeiro comunicado dos funcionários informava a greve à sociedade: "Em busca de salários e obrigações trabalhistas não cumpridas pela Editora Três (…); a favor da finalização das negociações que envolvem o controle da companhia; e por informações objetivas que apontem uma solução para as muitas questões trabalhistas pendentes, comunicamos respeitosamente ao público que nós, profissionais da Editora Três, resolvemos entrar em greve – amparada em lei e registrada na Delegacia Regional do Trabalho – a partir desta data".
 
"Estamos em greve!", dizia o segundo comunicado, dirigido "aos colegas da Editora Três". "Tem sido difícil trabalhar nestas condições, mas é o que temos feito até aqui. Nos últimos oito meses, desde que a crise se instalou, cumprimos à risca nossas obrigações com a Editora Três".
 
Os funcionários dizem ter mantido o "padrão de qualidade" das revistas e o respeito na relação com a diretoria. O grupo promete manter comportamento "civilizado", mas não abre mão do direito de greve. "Continuamos prontos a atender a qualquer chamado ao diálogo a ser feito pela direção da empresa. A diferença é que o faremos com o trabalho suspenso em todos os setores."
 
Semanais circulam – O salário de março tem de ser pago na segunda-feira – data também da nova assembléia dos funcionários. Até lá, os grevistas devem abrir um blog sobre a crise e ver a viabilidade de bloquear a entrada da editora durante o encontro. Cerca de 90% dos jornalistas aderiram à paralisação.
 
Apesar disso, as revistas semanais da Três devem ir às bancas normalmente neste sábado. Os redatores-chefe da IstoÉ, Mário Simas, e da IstoÉ Dinheiro, Luis Fernando Sá, não entraram em greve e prometeram fechar as próximas edições. Mesmo a IstoÉ Gente deve circular, já que seu novo número está praticamente finalizado.
 
Mino Carta lembra que a primeira capa de IstoÉ trazia o músico alemão Ludwig van Beethoven, "o grande surdo", com um aparelho no ouvido. O tema: a surdez e "a vocação brasileira para os ruídos clangorosos". Quem sabe a próxima capa – a última de uma fase – traga não um surdo, mas o célebre orelhudo que se especializou em escutas telefônicas.