Na semana passada, ficamos sabendo que o deficit fiscal brasileiro neste ano é um número que pode variar de R$ 50 bilhões a R$ 118 bilhões, dependendo de concessões de hidrelétricas e de como será encarado o problema das pedaladas fiscais.
Ficamos todos horrorizados com esses números. Afinal, são muito altos e indicam que o governo vai gastar muito mais do que deve arrecadar no atual exercício. Esse deficit é aquele que os economistas chamam de “primário” e decorre de atuação ineficiente e/ou irresponsável na administração dos recursos públicos.
Há, porém, outro deficit, muito maior, com previsão de atingir R$ 350 bilhões neste ano. É aquele que advém das despesas financeiras do setor público, ou seja, do custo da dívida pública de R$ 2,7 trilhões.
O curioso é que não se vê ninguém -ou quase ninguém- horrorizado com esse deficit financeiro monumental. Mais curioso é que esse rombo financeiro não se dá porque a dívida pública é exorbitante.
Ela é elevada, mas, girando em torno de 65% do PIB, parece até moderada quando comparada com as de outros países muito respeitados, como Estados Unidos e Japão, que devem 80% e 125% do PIB, respectivamente.
Lá nesses países, a dívida elevada não incomoda tanto por uma razão simples: os juros pagos para carregá-la giram em torno de 1% ao ano. Aqui, nossa taxa é superior a 14% ao ano.
Toma-se como líquido e certo que essa taxa, uma jabuticaba genuinamente nacional, é a mais apropriada para o Brasil, ainda que nenhum país adote hoje algo parecido, ainda que ela não esteja tendo o efeito desejado para conter a inflação, ainda que abra um buraco nas contas públicas até sete vezes maior do que o deficit fiscal.
Discutem-se cortes nos programas sociais que socorrem as populações mais pobres do país —querem tirar R$ 10 bilhões do programa Bolsa Família do ano que vem—, mas não se discutem cortes de juros, aumento de crédito e outras medidas para retirar barreiras ao consumo e ao crescimento da economia.
O país está viciado em juros. Os cartões de crédito cobram inacreditáveis 414% ao ano, taxa que foi motivo de chacota no jornal “The New York Times”. Os bancos, 264% ao ano no cheque especial e até 27% ao ano no crédito consignado, que concedem com risco zero. Lojas oferecem compras com parcelamento em cinco vezes, sem acréscimo no discurso, mas naturalmente com juros embutidos.
Estamos cercados de juros por todos os lados. Quem perde e quem ganha com isso? Perdem todas as pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas, que pagam impostos para sustentar os deficit financeiro e fiscal bilionários.
Perdem também as empresas dos setores produtivos, atingidas pelos custos exorbitantes do crédito e pela retração do consumo.
Ganham os que vivem de renda e, naturalmente, o setor financeiro. Basta observar os resultados do terceiro trimestre que os bancos começaram a publicar na semana passada, com lucros invejáveis. Já o setor produtivo, em especial a indústria, amarga prejuízos.
O país precisa entrar em uma clínica de recuperação para se livrar da intoxicação de juros. Enquanto não superar esse problema, dificilmente vai tomar um rumo sustentável de crescimento econômico, que possa criar empregos e oferecer oportunidades de uma vida saudável para os brasileiros. É uma pena.
Benjamin Steinbruch é presidente da CSN
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